top of page

O almirante e a mulata


Fotografia de Ingram em Recife, quando Comandante da 4ª Frota e Comandante da Força do Atlântico Sul. (Official U.S. Navy Photograph, National Archives collection).

O almirante norte-americano Jonas H. Ingram foi um homem-chave para a aliança Brasil-EUA durante a II Guerra Mundial. Contudo, as decorrências da sua ação de comando são pouco conhecidas e reconhecidas na historiografia nacional.


O almirante foi um herói condecorado, tendo recebido a cobiçada Medalha de Honra — a maior honraria do Congresso dos EUA — por sua atuação na captura de Vera Cruz, no México (1914), ainda tenente, manejando os canhões e metralhadoras do seu navio.[1]


Em fevereiro de 1942, quando assumiu o comando da Task-Force 3 (TF-3), Ingram deu início a um proveitoso contato com líderes civis e militares brasileiros. Seu temperamento alegre e aspecto bonachão impressionaram vivamente as autoridades nacionais.


Na leitura dos relatórios emitidos pela TF-3 (depois TF-23), é perceptível a exata compreensão da realidade política e social brasileira. Ao contrário dos seus compatriotas do Exército, o almirante enxergou o desejo brasileiro em manter a neutralidade na guerra como uma aspiração legítima e soberana, e não fruto das tendências “germanófilas” que o US Army e o OSS (futura CIA) apontavam com insistência.


Enquanto os analistas norte-americanos viam com desprezo o Exército Brasileiro e seus quadros miscigenados, congregando brancos, negros e pardos — uma aberração para os padrões americanos da época —, Ingram agia de forma diferente. Era um homem à frente do seu tempo, que destoava do padrão anglo-saxão. Mesmo alguns testemunhos com viés antiamericano lhe dão esse crédito:


“Os americanos não se misturavam, não confraternizavam, não davam a mínima atenção nem mesmo às autoridades. Destacava-se o comandante, entre eles o almirante Ingram, grande, gordo, vermelho, bebedor, que vivia com uma mulata, desmentindo o racismo de sua gente.”[2]


Em agosto de 1942, Ingram soube aproveitar a incursão do U-507 contra a navegação brasileira, atuando de forma incisiva — e pouco ortodoxa — para assumir a liderança da missão militar norte-americana no país.


Anos depois, brasilianistas respeitados, como Frank D. McCann, destacaram seu papel junto ao Governo Vargas e Washington, permitindo que Parnamirim Field se tornasse o “Trampolim da Vitória”. Porém, mesmo após sete décadas do final do conflito, boa parte da historiografia nacional ainda não reconhece o seu relevante papel para a vitória Aliada. Infelizmente, nem sempre o tempo é o senhor da razão.

____________________________________________________________

[1] Foram concedidas apenas 57 Medalhas de Honra à US Navy pelo governo dos EUA, durante a II GM. Medal of Honor Awards To Members of The U.S. Navy Compiled & Edited By C. Douglas Sterner.

[2] WERNECK SODRÉ, Nelson. Memórias de um Soldado, p.212. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1967.

Todos os Posts
Posts Recentes
Busca por tags
bottom of page