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Mito nº 1: o vilão ianque


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O mais antigo e persistente mito sobre a entrada brasileira na guerra, que envolve a suposta responsabilidade dos EUA, teve origem em um evento inusitado.


Em 30 de maio de 1942, o navio mercante norte-americano S.S. George Clymer navegava a cerca de 400 milhas náuticas da ilha de Ascensão, quando apresentou problemas mecânicos e ficou à deriva. Em 2 de junho, o capitão do navio enviou pelo rádio telégrafo um pedido de SOS, informando sua posição para o resgate. Todavia, a mensagem foi interceptada pelo navio corsário alemão Michel, que despachou para as coordenadas a sua lancha torpedeira Esau. A lancha localizou e torpedeou o George Clymer, obrigando seus tripulantes a abandonarem o navio a bordo das baleeiras (botes salva-vidas de madeira). Os homens foram recolhidos por um navio inglês pouco tempo depois, mas as baleeiras foram deixadas para trás, sendo arrastadas pelas correntes marítimas.[1]


Após mais de dois meses vagando em alto-mar, uma delas chegou ao litoral de Sergipe, na praia da Barra dos Coqueiros, acomodando-se justamente entre os destroços dos navios brasileiros atacados poucos dias antes. Além do nome pintado no casco, em seu interior a polícia encontrou indícios de origem norte-americana: objetos, roupas, foguetes sinalizadores, suprimentos — e até uma metralhadora portátil com bastante munição. Como as notícias veiculadas pelos jornais nacionais davam conta que os náufragos brasileiros haviam sido metralhados pelos agressores, os dois episódios foram ligados de imediato.[2]

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A misteriosa baleeira provocou outro temor na população local, profundamente abalada com as dezenas de cadáveres desfigurados que chegavam às praias. Havia o medo de que uma invasão silenciosa dos EUA estivesse em curso, pois Washington pressionava fortemente o governo Vargas com o intuito de instalar seus efetivos militares no Norte e no Nordeste. A imprensa brasileira, majoritariamente pró-Aliada, deu pouco destaque ao episódio, mas o boato grassou como uma epidemia no país.


O Ministério das Relações Exteriores alemão passou um telegrama cifrado às suas representações em Buenos Aires e Santiago, orientando os diplomatas a divulgarem a versão de que os navios brasileiros foram afundados por “responsabilidade única do Brasil”, visto que um submarino alemão foi atacado por um navio mercante armado e “agiu em defesa própria”.[3]

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Após o término da guerra, os relatos dos ataques à navegação brasileira, em agosto de 1942, foram encontrados nos diários de guerra da Força de submarinos alemã, do submarino agressor (o U-507), e até mesmo nas memórias do sucessor de Hitler: o grande-almirante Karl Dönitz. Entretanto, apesar de todas as evidências em contrário, persiste no imaginário nacional a teoria conspiratória que atribui a submarinos dos EUA a autoria dos ataques. Hoje o mito não se alimenta da propaganda nazifascista, mas da contínua doutrinação ideológica com viés antiamericano no meio escolar.

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[1] DUFFY, James P. Hitler's Secret Pirate Fleet: The Deadliest Ships of World War II.

[2] Submarinos alemães ou norte-americanos nos malafogados de Sergipe (1942-1945)? Artigo de Luiz Antônio Pinto Cruz e Lina Maria Brandão de Aras, publicado na Revista Navigator. Disponível em:

http://www.revistanavigator.com.br/navig17/dossie/N17_dossie5.pdf Acesso em 14 Jul 2015.

[3] PEREIRA, Durval Lourenço. Operação Brasil – O ataque alemão que mudou os rumos da Segunda Guerra Mundial, p.204.

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